segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Brincando de Fernando

sem título


O vento toca levemente o meu peito
às sete horas de uma tarde qualquer de dezembro
e parece tormar a vida
mais alegre, serena e profunda.
Mas não é o vento que transforma a vida
em algo mais alegre, sereno e profundo,
eu é que passe a ver a vida
de forma mais alegre, serena e profunda.
Mais ainda,
sou eu que estou mais alegre,
sereno
e profundo
nesta tarde qualquer de dezembro
em que o meu peito toca o vento com intensidade.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Um Lobo

Não se pode possuir um lobo.
Há de se admirá-lo, de longe.
Deve-se amá-lo longe.
É um ser que exige
muito cuidado e respeito.
Um lobo uiva, e esse uivo é perigoso.
Inspira, para o bem ou para o mal,
o que temos de mais forte,
mais intenso,
mais visceral.
O uivo de um lobo acende
o que temos de bem e de mal.
Não se pode possuir um lobo.
Mas pode se possuir o seu olhar soturno,
o seu terror noturno, a sombra
do seu uivo.

Mar Branco

Um poema é uma ilha
ancorada por um mar
branco e curto, como um dente,
e tão frágil quanto.

Tal qual o dente, este mar
amarela, apodrece,
conforme o tempo não para.
Animais o róem

até que não há mais dente
e o próprio mar se esfarela.
É quando o poema voa
pelo céu da boca.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Banco Imobiliário

Quatro casas, um hotel.
Quatro Casas,
um hotel. Quatro Casas
um
Hotel.

Quem dera a vida fosse assim tão simples.

E a Roda Gira

(obs: esse poema se maximiza se for lido logo após o "Flor de Lobos". É assim que ele esta(rá) no livro.)


E a Roda Gira

"Venço o cansaço na roda do
Contrabismo"
Jimmy Charles Mendes

Meu coração se fora. Todavia
é preciso coração
para recuperá-lo,
tatear no brilho das trevas,
voar como ave sem asas,
mergulhar até as alturas
sem vontade

(é preciso muita vontade
para se mergulhar sem vontade)
para se abandonar.

É preciso
um coração preciso.

Mas deve-se procurar
ainda que sem se saber o que
é preciso procurar o quê.

Caminhar a viagem eterna
até o fim

não o fim da viagem,
o fim do viajante.

É preciso viajar.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Pretensão

..........................................Vaidade das vaidades, tudo é vaidade
..........................................(Ecle 1,2)


Dizem que eu me acho muito inteligente,
grande,
superior.
E é tudo verdade.
Mas não são grandes todas as pessoas?
Não é inerente ao homem a inteligência
e a superioridade naquilo que lhes convém?
Então. Sou grande. Como tudo que é humano.

Dizem que eu desprezo a estupidez dos homens estúpidos,
rio,
cuspo na cara.
E é tudo verdade.
Mas não são estúpidas todas as pessoas?
não é inerente ao homem desprezar
e cuspir naquilo que lhes convém?
Então. Eu rio. Sobretudo da minha própria estupidez.

sábado, 7 de novembro de 2009

O lugar da poesia

A poesia está onde a chamam
baixinho,
onde dois ou menos se reunem
em seu nome,
em nome de todos os nomes.

Ela é uma intimidade entre dois corpos,
entre um corpo,
entre si.

Experimentar o poético
não é ser mais humano,
nem mais que humano
pois,
em todo lugar onde há o homem,
a poesia se expande,
se instaura,
se contrai.

Experimentá-lo
é, conhecendo o humano,
não o saber (e, não sabendo,
não saber que não se sabe)

Experimentar o poético
é não saber
o que você sabe.

A poesia é o lugar do ser
(entre outras coisas,
entre todas as coisas)

O clic

Agora.

Captar a essência da vida,
não,
a essência dos meus olhos.

Ver o espaço.

Olhar o mundo.

Guardar o instante.

Encontrar o ângulo adequado
e amá-lo.

Fotografar
a vida.
(nunca aparecer na foto?)

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Flor de Lobos

I

Em um lugar
a duas horas de onde quer que você esteja
uma flor
dorme.

Anda o quanto quiseres,
para onde quiseres,
a distância não diminui.

Ou aumenta.

Para alcançá-la
deves abandonar a ti mesmo
e caminhar por duas horas
(na direção correta, cuidado).

Abandonar não o teu corpo,
não o teu espírito.
Deves abandonar o eu
que em ti é um outro.

..................................................Abandonar-
.......................................................................te.

Alcançarás a flor?
A flor te alcançará.
Não onde estiveres.

Onde deixaste-te.

Há, porém, um porém:
ela morde.


II

Esta flor não tem espinhos.
Tem garras.
Não tem pétalas.
Tem dentes.
Não tem talo.

Também não tem coração.

Esta flor
não se pode arrancar,
não se pode sequer tentar
(duas horas, lembre-se)

Ela, no entanto,
ao acordar, te arranca.

(de Onde?
para Onde?)


III

Uma vez eu tentei
tentar arrancar a flor.


IV

Duas horas depois
acordei
sem dentes,
sem garras.
Meu coração se fora, todavia.

domingo, 30 de agosto de 2009

O Livro do Destino

O reino do Destino é um labirinto infinito
como um livro de Borges,
como todos os livros.

Por lá ele passeia,
enfastiado,
pois conhece todos os caminhos
de seu reino.

Quando Destino quer viajar sem rumo
ele lê o seu livro
e se perde no sonho dos homens,
no seu desespero, seu delírio,
sua destruição, seu desejo.
Se perde na sua morte.

Ou você acha que
o Livro do Destino
é escrito em prosa?

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

O Impenetrável

[E agora, um pouquinho do meu lirismo diabético.
Esse poema tem aí uns quatro, cinco anos de existência.]


O Impenetrável


Há na nudez desta prostituta
prestes a se entregar a mim em holocausto
fragmentos de um erotismo espiritual
que mal vaza dos seus olhos vazios.

Olhando ela assim, tão nua,
me dá vontade de conheçê-la
num sentido que não o bíblico.
Vontade de conhecer seu nome
- o verdadeiro -
seus livros preferidos,
seus sonhos,
seu signo.

Claro que nada disso existe na hora do trabalho.
Seu corpo está nu. Ela não.
Suas portas abertas escondem algo de impenetrável
e seus seios são como duas torres de vigia, cujas armas
permanecem em punho por causa do frio
(fingimos que é por minha causa)

Ela não diz nada com a boca.
A boca não serve para isso agora.
Mas não consigo deixar de pensar
que esta seta que carrego no meu centro
lhe abafa um grito.

Por fim essa mulher,
com uma lascívia impassível,
termina o serviço.
É quando, já quase lhe dando as costas,
vejo algo que me parece uma breve lágrima em seu rosto
e me excito pela primeira vez na noite.
Mas não.
Aquela secreção era minha.


domingo, 2 de agosto de 2009

Primeiro Encontro

[Esse é pra quem acha que eu só escrevo coisas "engraçadinhas". È um poema de março de 2006.]

Primeiro Encontro


14 de fevereiro, Valentine's day,
lua cheia.
Poesia no ar, na água, na terra.
Fogo no coração,
embora ainda não o saibamos.
Bebemos ardorosamente
toda a poesia,
com amor e fé
("Fé em quê?"
ouço alguém gritando)
depois passamos
para a cerveja
(não, espera,
ainda há bastante poesia
para tragarmos aqui
pelo ar e pela terra,
é uma livraria.)
Não adianta, queremos mais,
sempre mais,
vamos até a sua casa?
Ainda há poesia na terra,
a lua desce. É dia.
Agora os corações não se aguentam.
Um papo quente.
Mãos entrelaçadas.
Mil verdades.
Uma consequência
- é quando descobrimos nossos fogos
ardentes,
cândidos, uma novela
de Manoel Carlos.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Poema Etílico nº 2

(A Rafael Nunes)


A cachaça é choro de deuses. Seja
de tristeza, alegria, dor ou fúria,
esse pranto nos traz o despudor
e uma liberação da consciência

que nos permite, assim, compartilharmos
daquilo que eles têm de mais humano.
Por um instante, tornamo-nos eternos!
Porém o mesmo instante, após o instante,

vem cobrar sua conta, e nos lembrar
de que é com ele o nosso acordo. Eis
a maldição dos deuses, eis a nossa:

somos instante; eles, eternidade.
Porém, maior será nossa coragem
- que deuses beberão as nossas lágrimas?

sábado, 11 de julho de 2009

Trilogia Pessoana [inclui Reencarnação, Mãos desenlaçadas e Álvaro de Campos Revisited]

Oi, pessoal.

Talvez vocês conheçam algum desses poemas, ou todos eles, mas agora é a hora de colocá-los nos seus lugares, ou seja, juntos. Há um diálogo bem bacana entre os três textos do que eu resolvi chamar de Trilogia Pessoana, diálogo este que vai além do inevitável paralelo entre os heterônimos citados. Existe aqui uma diferença de ritmo que busca, entre outras coisas, acompanhar traços do espírito de cada heterônimo, drops de Fernando Pessoa e aspectos distintos do meu próprio trabalho. Há também pontos de unidade entre esses elementos todos.
Enfim, aproveitem.


Reencarnação


Uma cigana me disse uma vez
que eu era Alberto Caeiro
reencarnado.
"Mas ele é um heterônimo de Fernando Pessoa", repliquei.
"Ele nunca existiu".
A cigana, me perscrutando com suas bolas de cristal
(as de verdade, que ela guarda atrás dos óculos)
me respondeu: E você,
existe?

Não sei.

Sei apenas que há frias noites de uma chuva oblíqua
em que, mirando uma parede qualquer,
faço apenas isto. Existir,
excessivamente,
eu e a parede. Todo o resto,
Contemplar, Sofrer, me Indispôr,
perde sua relevância.

Uma cigana ne disse uma vez
que eu era Alberto Caeiro reencarnado.
Em noites como essa eu não acredito.



Mãos Desenlaçadas


Ricardo Reis morreu e hoje contemplo,
sozinha, o espetáculo do mundo,
mas Sofro ao ver que tudo é tão imundo
que não acho conforto em nenhum templo.

Existe, claro está que tudo Existe,
exceto quem não está mais ao meu lado.
Meu coração se encontra engaiolado,
e as rosas dos jardins são mero alpiste.

Gostava do seu plácido otimismo
eternamente à beira de um abismo.
Agora que estou só, não me contento

com isso que está aí. Tanta perfídia
no mundo me Indispõe, e é só o vento
quem seca o pranto dessa pobre Lídia.



Álvaro de Campos Revisited


Quem colou os cacos deste vaso?
Quem o encheu de flores? Será que não se Indispôs
com as sobras, os vazios? Agora esta cola o prende
com tal precariedade
que um mero empurrão o esfacelaria novamente,
em pedaços ainda menores,
e com mais louça, muito mais louça, até se tornar inevitável
que Existam vários vasos com os cacos de um.

Três, para ser exato. Um enorme,
selvagem, primitivo. Outro ordenado e imponente,
como vaso etrusco, ilustrado com deuses vingativos.
O último, bem pequeno, com forma e Sofrimento semelhantes
às do vaso original.

Ah, quem pode dizer, agora que foi tudo refeito, reformado, regurgitado,
qual é a face verdadeira desses vasos?
Seria a exterior, pintada e adornada,
cada uma à sua maneira?

Ou a face voltada para dentro, a face escura,
cujas teias de aranha só podemos Contemplar
se analizarmos os vasos com muito afinco,

e que o vaso, ele mesmo, nunca vê?

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Abrindo o baú Nº 1 [inclui Chuva]

Uau.

Arrumando meu quarto, minhas coisas, vejo que achei mais do que esperava. Encontro, em uma caixa de sapatos, coisas de há muito, muito tempo atrás, do que parece ser uma galáxia distante. Fotos, agendas, camisas de colégio com assinaturas da turma inteira (ainda fazem isso hoje em dia?), ingressos de filmes antigos... e meus primeiros textos! Falo de textos anteriores a qualquer pretensão séria em relação à minha obra, textos que nasceram das minhas primeiras audições de Caetano, da minha primeira descoberta da Língua.

Não resisto a partilhá-los com vocês. Claro, são textos de um adolescente que mal sabia o que é a poética (saberá ele hoje?), que engatinhava na miríade de possibilidades de expressão literária. Mas, creio eu, já tinha o que dizer.

Ah, sim, são textos do século passado.

Vamos ver?


Chuva


Está chovendo.
Meu corpo semi-permeável não deixa passar água
não, nada da água cristalina que poderia me purificar.
Mas a chuva passa
e meu coração fica nublado, cinza,
um cinza-escuro, carregado de dor sem razão
(ou talvez haja razão, mas a neblina dificulte a visão).
Mas não importa. Há dor. Isto é fato.

Um coração vazio, a própria presença do Vazio,
a falta de tudo o que importa no momento
obriga o poeta - eu - a pensar, sentir, ser alguma coisa
para poder escrever-se, interpretar-se
e o masoquismo então toma conta,
o paradoxo da angústia toma conta dele - de mim - e acontece
de o poeta ser mais cheio quando está mais vazio.

(Novembro/1998)

terça-feira, 30 de junho de 2009

Endless III

All right, baby, come on.
It's time to dream.

Wake up.

Endless II

I am not afraid
to die
today.

But I'm afraid to
die.

Endless I

I can see who you are,
where you are,
where you'll go (it's not far).

You have no mistery,
not for me,
'cause I am your whole Destiny.

Olha, tem gente comentando...

Ai, ai, o pessoal de Letras tem esse problema, a gente fica querendo fazer "a" análise dos textos dos amigos, aí se na hora de comentar não rola uma gag, um trocadilho, uma frase muito relevante, a gente acaba também não falando nada.

Pois eis que, ainda assim, com uma semaninha de blog, já tenho a acreditável soma de 3 comentários!!! Após dois comentários no nosso querido Sargento Azul ( um deles inevitável, é verdade), quem comenta é o nosso amigo Lúcio! Claro que, pessoal de Letras, esses aí acharam coisas bem interessantes pra dizer. Mas é isso aí, gente! vamos comentar sempre, mesmo que seja só pra dizer "gostei" ou pra dar uma crítica construtiva...

Zodíaco

Sou virginiano,
com ascendente em Sagitário,
lua em Peixes.

Terra.
Fogo.
Água.

--------------------------

Talvez por isso essa falta de ar...

domingo, 28 de junho de 2009

O impacto do Impacto

uma garota................................................um caminhão
uma garota........................um caminhão
uma garotaum caminhão


A colisão colidiu com todos os que ali passavam.




Parando de fumar? [inclui .Um Cigarro. e .A vela Mágica.]

Pessoal, estou parando de fumar. Não sei como serão os próximos meses, se aguentarei firme sem colocar unzinho que seja na boca, se terei recaídas homéricas, se irei reduzir até níveis mais ou menos aceitáveis, ou mesmo se desistirei de vez e que se dane os meus pulmões. Quem sabe o que se esconde por dentro do manto do Destino? Sei que hoje sou alguém que está parando. Alguém que, como todos os que iniciam à vera uma luta contra o vício, não consegue pensar em outra coisa. Então, amigos, hoje coloco dois poemas que falam de que? Pois é. O primeiro é de 2005 ou 2006, acho, mais ou menos de quando eu estava começando (a escrever? a fumar?). O segundo já é de 2009, de um daqueles dias em que Destino (olha Ele aí outra vez) pisca o olho pra gente por motivos que nunca se tornam claros. Enfim, lá vão eles.


Um cigarro.


Aqui,
onde vaporosas linhas curvas
giram sem pressa,
criam formas artificialmente dionisíacas
e sobem, como um incenso ateu
que leva mudas orações para deuses surdos.

Aqui
onde uma fina folha de um papel branco
como o luto no oriente
envolve, silenciosamente,
as Cinco Mil Folhas,
ignorando por completo seu conteúdo
(e se o conhecesse não se importaria).

Aqui,
onde minha boca absorve
o incenço, absorve
as Cinco Mil folhas
e traga a vida para si,
dela extraindo profundidade
às custas da vastidão.



A vela Mágica.


Quando trago meu cigarro
sou eu quem se acende inteiro
pois trago no meu isqueiro
o fogo que acende o barro

e transcende a carne em vento
como o deus me prometeu.
O fogo de Prometeu
que traz o conhecimento,

a língua e o odor fantástico
da vida em estado agora,
é esse o fogo que mora
no meu isqueiro de plástico!

Porém, trago aqui um adendo
a todos seres que comem:
eu só empresto pra homem.
Pra mulher, eu mesmo acendo.

domingo, 21 de junho de 2009

Cavalo Marinho

Nadar tranquilamente
..por sob as águas claras
....(claras como seus olhos).
Cantar, despreocupado,
..sabendo que o oceano
.....abraça minha voz
...e a torna indiscernível.

.....Amar, amar, amar,
.........e quando for a hora
- talvez antes, quem sabe? -
.........ser eu a engravidar.

No entanto, eu não sou
um cavalo marinho,
e a triste e alegre hora
.................escapa de meus dedos
......................................(e de todos os dedos)

além do meu alcance,
.........como a pluma da pedra;
além do meu alcance
.........como o mistério último;
além do meu alcance
.........como o sangue da terra,
....................como um fim sem princípio,
..............................como um ventre vazio.

sábado, 20 de junho de 2009

Poemabandonado

(por PH Wolf & Jessica Cuervo)


.........."Dois fodas mais uma foda
..........fazem um fodinha."


Um brinde ao sexo poligâmico,
à crueza dos corpos em estado orgânico.

Um brinde à oligarquia das drogas entorpecentes
estragadas, malhadas, embaçadas, doentes.

Um brinde à boemia,
à falta de escrúpulos, à acefalia.

Um brinde à mutilação genital,
aos muros malfeitos, ao sexo animal.

Um brinde à melancolia dos sintagmas polissêmicos,
à nudez engravatada, aos hipócritas acadêmicos.

Um brinde ao vinho e às reclamações,
e às pessoas sem piedade que partem corações.

Um brinde ao seco, um brinde ao molhado,
às pessoas orando em seus corpos suados.

Um brinde ao gerúndio, um brinde ao catolicismo,
às almas miseráveis penduradas no abismo.

Um brinde à música ruim,
às festas e orgias que se fazem sem mim.

Um brinde à bebida alcoólica quente,
à luz do sol laranja que derrete a gente.

Um brinde aos livros sem pauta
que trazem terror a gente incauta.

Um brinde à depressão generalizada,
à tristeza dormente, à calma irritada.

Um brinde às nossas tão pendulosas dores,
um brinde aos políticos, assassinos, estupradores.

Um brinde aos cigarros do Paraguai,
e àquela pessoa especial que se vai.

Um brinde aos bons amigos e aos falsos,
que nos mandam direto aos cadafalsos

com os cabelos em chamas, olhos em percalços,
corações em pedaços e os pés descalços.

Um brinde aos alienados,
aos corações mal-amados.

Um brinde às moedas sem valor,
rejeitadas, enjeitadas, seja onde for.

Um brinde à majestade, um brinde à poesia,
um brinde ao que não rima, mas queria.

Um brinde àqueles que choram escondidos,
invejosos, pois nunca foram traídos.

Um brinde à embriaguez inevitável,
à mente entorpecida que permanece saudável.

Um brinde à elegância dos óculos escuros
que nos enchem de sarcasmo e que nos tornam puros.

Um brinde à ironia, à cefaléia, à bradicardia,
um brinde à algia!

Um brinde ao poema que está se acabando,
aos solitários que andam em bando.

Dois poetas permanecem rimando.
Dois poetas permanecem.

A Alegria

A Alegria
(A R. Ducinni)



A Alegria
é uma filha da puta escrota
que vive na minha aba.
Sempre do meu lado nas festas,
nas baladas, no barzinho,
mas na hora em que a gente mais precisa dela,
cadê?
Onde foi que ela se meteu
quando a minha primeira namorada me deu um pé na bunda,
quando eu perdi o meu primeiro emprego
quando eu levei o meu primeiro zero em matemática?
Cadê ela
no dia da morte do meu primeiro filho?

A Alegria
é um frango de padaria
brilhante e suculento,
mas depois que a gente come
o que sobra é a farofa no dente.
Ela é ambígua como beijo de mulher feia,
instável como o verão do Rio
e efêmera, como todas as tardes de domingo.

A Alegria é a programação da TV das tardes de domingo.

Mania da gente de se apaixonar por quem não vale nada...
Mas se é pra gostar dessa piranha desdentada,
dessa vagaba,
dessa filha da vida,
também vou sacanear.
Vou amá-la, sim,
mas o meu amor vai ser que nem ela.
Efêmero.
Instável.
Ambíguo.
Vou amá-la como a uma mulher de malandro,
como a uma rameira de rodoviária.
Porque aí ela é quem vai me querer.
Vai se ajoelhar aos meus pés,
vai se humilhar, implorando
por um pouco de respeito,
para que eu me entregue totalmente,
para que eu seja só dela de novo.
E eu alegremente direi: não,
e voltarei para a minha melancolia
que é quem me faz feliz.

Recomeçando...

Então, mais um blog. Quanto tempo esse irá durar? Só os deuses sabem. Ao menos desta vez não estou sozinho. Espero manter uma relação dinâmica com todos esses links aí à esquerda, comentando-os e sendo comentado por eles. Vamos ver.

Então, vamos começar com um clássico?