quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Ronin

Jurei lealdade absoluta a meu Senhor
e Seu reino.

por anos defendi-os arduamente
com língua, espada e língua.

O mundo era bom.

Um dia, meu senhor nunca existira.
Seu reino sempre fora uma falácia.

Agora ando só.

Comigo, apenas uma língua sem fio,
uma lâmina seca,
um juramento quebrado.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

De costas

Estar de costas é andar sempre encoberto.
Ser como um livro terminado e nunca aberto,
cartucho velho não se sabe de qual jogo,
o frio espesso que se esconde atrás do fogo.

Porque de costas todo choro é invisível,
todo contato é sutilmente inacessível.
Estar de costas sendo visto é nunca ver.
De costas, cada punhalada é pra valer.

De costas, tudo ao que se crê se sobrepõe
pois muito mais do que o que vai é o que já foi.
Estar de costas é o depois de despedida,

o caminhar sem nunca mais olhar pra trás,
o estar além (e aquém) das hostes dos mortais,
o nunca dar nem nunca receber guarida.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Sem Título


Se um dia você se encontrar,  
sem razão aparente,
assim, como num sonho,
tão feliz que dá vontade de gritar,
 
Não.
 
É Deus que está sonhando com você.
Não O acorde.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Mais um pôr-do-sol

De volta. Após nove meses. Enfim. Um pouco de Sol, o Rio precisa.



Mais um Pôr-do-Sol


O Sol se põe atrás de uma montanha
(Até aí nenhuma novidade,
isto acontece todo dia, atrás -
e à frente - de todas as montanhas).

Esta é, porém,
uma daquelas ocasiões singulares
em que o Sol modifica a palheta de cores do universo,
tudo adquire o mesmo tom rosado
e as margens do céu prendem a respiração.

Duas senhoras conversam em frente a suas casas.
Comentam a cor do Sol,
comentam a cor do céu.
Mas elas não comentam a cor das paredes brancas,
a cor do chão cinza, das árvores verdes.
Não comentam sua própria cor.

Eu, olhando e sendo olhado por todo este esplendor,
me entristeço de leve ao lembrar-me das primeiras vezes
em que vi um pôr-do-Sol desse jeito.
Este, como aqueles, é um pôr-do-Sol inesquecível,
mas eu já vi muitos assim
e não me lembro de todos.

Chegará o dia
em que não me lembrarei de nenhum destes.
Lerei estes versos
e ainda assim não me lembrarei.
Por isso me entristeço.
Porque não poderei me entristecer então.
Por isso olho pra trás. Porque
chegará o dia
em que não mais me lembrarei de olhar pra trás,
não haverá em mim motivo para olhar
ou o que olhar.

Nenhuma novidade.

O que me acalenta e me conforta de leve é que também
chegará um dia
em que meu filho verá um pôr-do-Sol como o de hoje
pela primeira vez
e, um dia, o filho dele.
nestes dias
o novo será novo novamente
e as margens do céu irão suspender a respiração
(entenda, isto acontece todo dia,
atrás - e à frente - de todas as montanhas).